CNC indica tendência de crescimento de preços no comércio e baixa do consumo em 2021





CNC indica tendência de crescimento de preços no comércio e baixa do consumo em 2021

Estudo especial da entidade sobre índices de inflação mostra que pandemia desregulou indicadores do atacado e do varejo

Com base em um estudo especial sobre o comportamento dos índices de inflação durante a pandemia do novo coronavírus, a Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) aponta que a tendência para 2021 é a de que, pelo menos em um primeiro momento, os valores praticados pelo varejo aumentem e o consumo caia, especialmente entre as famílias de baixa renda. A análise mostra que, no ano passado, os indicadores de preços dos setores da produção industrial subiram significativamente, descolando-se dos índices de preços ao consumidor final, após uma década caminhando juntos.

Segundo o presidente da CNC, José Roberto Tadros, a desorganização dos preços formados nos mercados produtores, com falta de insumos, importados mais caros, dólar alto, elevação das commodities e aumento dos custos das empresas, pode ser percebida com maior proporção nos indicadores do atacado do que nos preços ao consumidor. “Se as empresas do varejo não conseguem suportar o aumento de preços da esfera da produção e do atacado, acabam sacrificando a margem de lucro e, quando é possível, fazem repasses que elevam os preços finais, impactando as decisões de compra dos consumidores”, afirma Tadros.

A CNC analisou a evolução dos preços na última década e concluiu que eles praticamente caminharam juntos entre 2011 e 2019. Em 2020, contudo, a crise da covid-19 provocou um choque nesta relação de equilíbrio, acarretando variações atípicas dos preços. A partir do ano passado, os agentes que possuíam contratos atualizados pelo Índice Geral de Preços-Mercado (IGP-M) tiveram reajuste muito superior ao aumento dos contratos reajustados pelos índices de preço ao consumidor (INPC e IPCA). Fenômeno que tem persistido.

De acordo com Antonio Everton, economista da CNC responsável pelo trabalho, o movimento também tem relação com as diferenças metodológicas dos índices: “O IGP-M carrega peso acentuado da variação dos produtos no atacado. O Índice de Preço ao Produtor Amplo-Mercado (IPA-M) participa com 60% na formação do IGP-M, representando a mudança nos preços dos agropecuários e industriais nas fases de comercialização em grande escala, anteriores ao consumo final”. Segundo ele, uma das características do IPA-M é “refletir custos de produção, matérias-primas, insumos e tarifas, bem como apresentar-se sensível à variação do dólar, por causa do comércio exterior e das expectativas dos agentes na formação dos preços”.

O IPCA e o INPC avaliam o desempenho dos preços na etapa posterior à do atacado, na ponta do consumo. O primeiro mensura a inflação oficial que baliza a meta do Banco Central (BC), apurando o custo de vida médio das famílias com rendimento de 1 a 40 salários mínimos. O segundo estima a cesta de produtos e serviços das famílias com renda entre 1 e 5 salários mínimos. “Assim, este indicador reflete a variação de preços em grupos mais sensíveis a aumentos, considerando que destinam boa parte do seu rendimento a itens básicos, como alimentação, habitação, transportes e medicamentos”, explica Antonio Everton.

2020 x 2021

A alta acentuada do IGP-M e do IPA-M aconteceu a partir de junho do ano passado, quando os preços industriais e nas esferas da comercialização em larga escala puxaram os demais índices para cima. A situação de tendência de alta no atacado se manteve até o fim de 2020 e continuou neste ano. Quanto aos preços ao consumidor, o recrudescimento ocorreu a partir de setembro último, permanecendo até dezembro. “O que acontece no atacado, posteriormente, reflete-se no consumo final, impactando as famílias de acordo com o nível de renda”, destaca Everton.

O comportamento dos indicadores não sofreu grandes alterações no primeiro trimestre deste ano, em relação ao fim do ano passado. No acumulado de janeiro a março, os indicadores do atacado apresentaram elevação, aumentando, por extensão, pressões sobre os preços no varejo. Neste período, destaca-se a forte taxa do IPA-M (10,57%), indicando a continuação do processo inflacionário. Antonio Everton chama a atenção para o fato de que, em 12 meses, até março último, a inflação para as famílias ultrapassou a meta do BC, de 5,75%. “O Banco Central tem demonstrado preocupação e atuado no sentido de elevar a taxa básica de juros para conter o movimento de alta nos preços”, indica o economista, ressaltando que, por causa da inflexibilidade que os preços possuem para baixar, os produtos industriais de uma maneira geral ficaram bem mais caros, principalmente considerando os aumentos do combustível e da tarifa de energia elétrica, juntamente com o câmbio.

Para José Roberto Tadros, o cenário indica que os problemas do fim do ano passado persistem e poderão levar tempo para retornar à normalidade de antes da crise. “A retomada não ocorreu conforme o previsto, e continuamos experimentando as consequências e o agravamento da situação, em especial com o ritmo lento da vacinação”, reforça o presidente da CNC.

A permanência da escalada da inflação nos setores revela o que tem se verificado na ponta para o consumidor final, como a escassez de alguns produtos e o aumento de preço de outros, bem como as dificuldades de reposição para atender à demanda final. A pesquisa indica ainda que os preços podem vir a se equilibrar posteriormente, mas em patamar maior, com os produtos industriais ficando mais caros de uma maneira geral e os comerciantes tendo dificuldades para fazer repasses.

Micro e pequenas empresas são as que mais sofrem

As diferenças entre os indicadores potencializam as dificuldades de negociação pelas quais as empresas do varejo, em particular micro e pequenas, podem passar com fornecedores e distribuidores. “Tal conjuntura provoca, sobre as empresas de menor porte, uma situação de aperto, de compressão de margens para calibrar melhor os preços, levando-as, de certa forma, a comprometer o resultado operacional”, aponta Antonio Everton. “Isso pode fragilizá-las em determinados momentos, tendo em vista a sustentabilidade do negócio e as condições para poderem conseguir repassar o aumento de custos e sobreviver”, ressalta.

Antonio Everton acrescenta ainda que, em contexto mais amplo, a desorganização do sistema de preços não é particularidade brasileira e pode ser vista como um fenômeno global. “Isso acontece em decorrência do trauma provocado pela pandemia na formação dos preços internacionais através da desorganização das cadeias de valor, preços dos contêineres, dos fretes marítimos, entre outros”, conclui.

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