Vivendo E Aprendendo.

Quem já teve a certeza sobre algo, e, passado algum tempo, percebeu que estava redondamente enganado?
Tenho certeza, amigo leitor, de que você também já passou por essa experiência.
Mas fica tranquilo que não vou puxar da memória situação cujo resultado foi desagradável ou triste. É o embaraçoso que me interessa…
Daí que eu e alguns amigos fomos passar um dos últimos finais de semana de julho no Guarujá, ilha chamada carinhosamente de a Pérola do Atlântico.
Chegamos bem cedo e fomos à praia.
Para mim, que não sou fã de calor, estava perfeito, pois nesse mês o sol não está ardido e o mormaço tirou férias.
Além do que, a Pitangueiras estava praticamente vazia, sem aquela chusma de banhistas a engalfinharem-se por alguns metros quadrados de areia, e por outros metros cúbicos de mar.
É claro que os ambulantes lá estavam; em menor número, é verdade, mas nem por isso deixariam de nos oferecer, insistentemente, os seus serviços e mercadorias em intervalos regulares, assim que fixássemos o guarda-sol e nos acomodássemos nas espreguiçadeiras.
Eu e meus dois amigos resolvemos andar pela praia; a ala feminina preferiu passear só quando voltássemos.
O passeio transcorria sem pressa nem preocupações. Apreciávamos o mar, as ondas, a famosa ilhota próxima à praia (até hoje não sei se tem um nome), e ríamos de uma e outra vulgaridades.
De repente, ao desviar os olhos do mar para os prédios, tomei um baita susto!
Calma! Nenhum prédio desabava.
O que me deixara pasmado foi a situação em que se encontrava um prédio revestido de pastilhas. Havia inúmeras pichações!
Por mais incrível e revoltante que pudesse parecer, cerca de oitenta por cento do edifício estava pichado, seja na fachada frontal, seja nas laterais!
Eram gigantescas marcas em forma de x, a maioria deles rodeados por círculos; além de um coração, se não me falha a memória.
Mais que depressa, apontei aos meus amigos aquele acinte à civilização.
Ambos ficaram atônitos, pois não acreditavam como alguém conseguira ser tão ousado a ponto de emporcalhar praticamente um prédio inteiro, e localizado bem na rua da praia!
O mais surpreendente é que aquele criminoso teria conseguido pichar até em locais inacessíveis aos mortais, o que pressupunha tivesse sido ajudado ou descido sozinho de balancim. Daí que não concebíamos como ninguém conseguiu ver tamanho atrevimento!
Não preciso dizer que de nós três partiram inúmeros impropérios…
Seguimos, porém, o nosso passeio, mas sem deixar de lamentar os pais daqueles pichadores. Afinal, concluíamos, deve ser muito triste dar amor e educação para um filho e descobrir que preferiu se tornar um vândalo da pichação a um artista do grafite.
Ao voltarmos para o guarda-sol, repassamos o lamentoso espetáculo. E naturalmente ouvimos dos que ficaram outras tantas reprovações.
Menos mal que o desalento e a revolta foram passando à medida que o bate-papo crescia, temperado que era por comestíveis e “bebestíveis”; mais estes do que aqueles.
À tarde, antes de irmos todos passear no calçadão, os homens não aguentaram o esmerado – para não dizer demorado – toalete das mulheres e resolveram descer para a rua. E as aguardávamos sentados comodamente em um banco.
Súbito, olhei para o prédio defronte ao nosso e vi os mesmos símbolos que víramos naquele prédio à beira-mar, só que em menor número.
Imediatamente avisei os meus amigos, que também se chocaram com a ousadia daquele pichador. Aliás, já pensávamos em uma gangue.
Em seguida, virei para verificar se o nosso prédio também tinha sido alvo dessas bestialidades.
Por sorte, nada de pichações.
Um outro fato, no entanto, chamou a nossa atenção. No prédio pichado havia, como no nosso, um sofisticado esquema de segurança, com câmeras e sensores, além de muros altos e dois funcionários na guarita.
Como, então, aqueles pichadores transpuseram todo esse aparato, e conseguiram pichar aqui e ali sem serem notados?!
Quando nossas mulheres e filhos chegaram, lá fomos nós apontando para o prédio vizinho, e comentando, desanimados, a ousadia daquela gangue, que parecia ter dominando o Guarujá.
Os recém-chegados olharam para cima, e, salvo minha esposa, também se solidarizaram com a falta de cidadania que parecia não ter limites.
A exceção, porém, tinha um motivo. Sendo minha esposa arquiteta, ao olhar para aqueles símbolos, foi logo rindo e esclarecendo que não eram pichações, mas, sim, sinais de mapeamento.
O mapeamento, explicou, é a identificação das áreas que devem ser consertadas, arrumadas, restauradas.
E tal como acontecera àquele prédio junto ao mar, o defronte ao nosso também tinha sido mapeado por uma empresa, que marcara os locais em que as pastilhas tinham caído ou estavam prestes a desgrudar.
Amigo leitor, consegue imaginar a cara que nós homens fizemos ao sabermos desse tremendo engano?
Pois é, essa mesma…
E já que capto uma risada espontânea vinda de sua parte, que tal contar algum embaraço por que tenha passado? Ora, riamos ainda mais!
Dias Campos
diascampos1@gmail.com,

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