Gostaria de tecer alguns comentários sobre um assunto que por certo deixa todos os escritores bastante revoltados. Refiro-me ao fenômeno comum de conseguirem transformar mediocridades em best-sellers. Quem já não soube de um livro, cuja história é simplória, simplesmente pornográfica, abusiva quanto à violência, e que foi aclamado como uma revelação e elevado aos píncaros literários com a ajuda de um marketing muito bem executado? Minha língua está fervendo para apontar um e outro autores que foram catapultados dessa maneira!… Por óbvio que não poderei citar ninguém, pois não estou com a mínima vontade de ter que contratar um advogado. Mas, convenhamos, isso não nos deixa revoltados?! Isso me faz lembrar de um sujeito que conheci e que resolveu ser escritor. Até aí, tudo bem; isso é absolutamente louvável. No entanto, cheguei a ler um de seus livros… Além de não saber o português – fato verificado pela só leitura dos poucos e-mails que trocamos – a história era insossa, os personagens, paupérrimos, e o epílogo… bem, tão apagado que dele não me recordo. Mas o pior é que sua editora resolveu criar um prêmio literário entre seus autores, e o galardoou com o título de “Escritor da Década”! Isso sempre me faz lembrar do nosso sempre Machado e do seu conto Aurora sem dia. Nesta história, Luís Tinoco pensa que é um poeta. Mas seus textos nada tinham de belo; não vinham da alma, como apontava Voltaire. Eram divinos, contudo, apenas para ele, que não conseguia ver quanta porcaria escrevia. Um amigo até que tentava dar-lhe alguns toques, mas Luís Tinoco estava tão envolvido em sua “áurea poética” que sequer conseguia percebê-los. E para que sua literatura ganhasse o mundo, chegou até a editar uma Revista, Goivos e Camélias – Machado não poderia ter escolhido melhor título. É claro que ninguém se tornou assinante. Daí me pergunto; daí, repergunto: Quantos Luíses Tinocos conhecemos e quantos mais teremos que suportar? Alguns diriam que o tempo, juiz incorruptível, se encarregará de separar o joio do trigo. Concordo plenamente. No entanto, enquanto Sua Excelência não sentencia, o indigesto grassa. A propósito, isso também me faz lembrar de uma entrevista com Philip Roth que li há alguns anos, em que o consagrado escritor afirmou que um bom romance leva pelo menos quatro anos para ser concluído. Concordo em gênero e número! – Aqueles que têm bom cunho português sabem que é impossível concordar com o grau. Mas a vida é assim mesmo. E esse triste fenômeno continuará ocorrendo. Por isso, trago à baila alguns poucos conselhos destinados a quem nobremente quer se tornar escritor, a fim de não ser comparado àquele protagonista machadiano. Estes conselhos tiveram a honra de integrar o livro Palavras em movimento, da escritora, editora e amiga Silvia Bruno Securato: Quando alguém me pede conselhos sobre como escrever, seja uma crônica, um conto ou um romance, sempre retruco com duas perguntas. A primeira, se a pessoa gosta de ler. Se responder que sim, passo à segunda pergunta. Mas se disser que não, recomendo que comece a ler o mais rápido possível, uma vez que todo texto produzido sem o prévio e prazeroso hábito da leitura terá pouca ou nenhuma qualidade. Mas, então, ler o quê? Tudo. Mas principalmente os clássicos, uma vez que será por meio deles que desenvolveremos e aprimoraremos as técnicas da escrita, e, portanto, alcançaremos o nosso estilo. Não por isso que o historiador Leandro Karnal já afirmou que “A obra clássica é multifacetada. Muda nosso lugar no mundo. Ela desafia nossos limites e revira as ideais.” (O Estado de São Paulo, Caderno 2, C8, 14/12/18). E esse conselho é tão precioso, e verdadeiro, que já fora experimentado, e aprovado, por Fielding e Balzac. A segunda pergunta se refere à bicicleta. Como assim?! Ora, pergunto àquele que quer escrever se sabe andar de bicicleta. Se disser que não, pergunto se sabe nadar. E assim por diante, até ouvir uma resposta afirmativa. Mas, para facilitar o entendimento, suponhamos que ele tenha respondido sim na primeira vez. Daí pergunto como ele aprendeu a andar de bicicleta. Ora, por certo dirá que foi subindo, pedalando, e caindo; subindo, pedalando, e caindo… Até que não mais caiu. Pronto! Você acaba de responder como aprender a nadar, como aprender a falar em público, e, pasme! como aprender a escrever qualquer tipo de texto. É óbvio que os primeiros textos não poderão ser classificados como best-sellers. Mas, e daí? Será que você já começou a pedalar, a dar braçadas ou a falar em público nas primeiras tentativas? Nem você, nem eu, nem ninguém. Portanto, se você preenche – como eu e Silvia Securato preenchíamos –, o requisito principal (e necessário) para escrever, qual seja, se você tem vontade de escrever, agarre-se a ela, leia atentamente os conselhos contidos nesta maravilhosa obra, sente-se defronte ao computador, e escreva! Simples assim. Com o passar do tempo, lendo e escrevendo sem parar, sem jamais desistir do seu sonho, você dominará cada vez mais as técnicas e os macetes de cada tipo de texto, o que permitirá desenvolver o seu estilo, e trará alegria e realização. Mãos à obra! Dias Campos diascampos1@gmail.com
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