Encontro nos dias 5 e 6 de setembro busca transformar o cenário de enfermidades raras no país
Campinas, agosto de 2025 - A jornada de um paciente com uma doença rara pode ser comparada a uma odisseia: é repleta de incertezas, atrasos e barreiras. Para ajudar a superar esses desafios, um novo conceito no cuidado dos pacientes raros chega para oferecer mudanças significativas: o de enfermeiras navegadoras, já estabelecido na área de oncologia.
“A navegação é um modelo de cuidado, centrado no paciente, que tem o objetivo de diminuir barreiras”, explica Erika Maria Monteiro, presidente da Sociedade Brasileira de Enfermagem em Genética e Genômica (SBEGG) e pioneira do conceito de navegação em doenças raras.
Este será um dos temas abordados no evento de capacitação de enfermeiros “Olhar Raro”, que acontecerá em Campinas nos dias 5 e 6 de setembro, no Royal Plaza Tower. O encontro busca aprimorar os conhecimentos desses profissionais para atuarem como guias essenciais na vida de pacientes com doenças raras, transformando o cuidado e a adesão ao tratamento.
Conheça o conceito de navegação
A enfermagem de navegação foi normatizada no Brasil pelo Conselho Federal de Enfermagem (Cofen) em 2024,1 após o Programa Nacional de Navegação de Pacientes ser criado em 2022. O enfermeiro navegador tem potencial de mudar o curso da vida de uma pessoa ao atuar sobre os primeiros sinais e sintomas de uma doença, seja ela rara ou não. São pessoas que se tornam peças-chave no tratamento, oferecendo assistência individualizada a pacientes, famílias e cuidadores do diagnóstico ao tratamento e ao fim da vida.
De acordo com a enfermeira Erika, o profissional é um elo entre o paciente, a família e a equipe multidisciplinar, servindo como contato principal para quem será tratado. Suas competências incluem a coordenação do cuidado, a comunicação efetiva e a facilitação do acesso aos serviços de saúde.
A eficácia dessa atuação pode ser medida pela diminuição da ansiedade, da depressão e do estresse, além da melhora dos sintomas e da qualidade de vida dos pacientes. Além disso, a prática de navegação ajuda a reduzir o tempo para o início do tratamento. "Com a capacitação adequada, esses profissionais podem ajudar a acelerar esse processo diagnóstico e evitar atrasos no recebimento de tratamentos adequados, prevenindo sequelas e até mesmo um óbito precoce desse paciente", complementa Erika.
“A relevância do tema é evidente, já que no Brasil mais de 13 milhões de pessoas vivem com alguma doença rara, número que pode ser maior devido ao subdiagnóstico”, adiciona Keyla Santos de Sousa, enfermeira do Hospital Alvorada de Imperatriz no Maranhão, que dedica sua vida a transformar o cenário das doenças raras no sul do estado. Em 2024, a profissional de saúde apresentou o projeto de lei (PL) Nº07/2024,2 que instituiu o Dia de Conscientização da Acondroplasia, a Semana de Conscientização das Doenças Raras e a carteirinha ao portador de doenças raras na cidade. Em uma sessão histórica na Câmara de Vereadores de Imperatriz e com aprovação unânime, a proposta foi acolhida integralmente, solidificando um marco importante para a comunidade.
A história de Keyla e seu primeiro contato com um paciente com uma doença rara ilustra a importância do conceito de navegação dentro da enfermagem.
“Eu tive meu primeiro contato com Davi, que tinha mucopolissacaridose (MPS) do tipo 2, durante uma infusão de medicação e ali criei um vínculo com ele, cuidei dele durante quatro anos, tanto no hospital quanto em casa durante a pandemia”, conta a enfermeira. O tratamento de Davi, no entanto, foi interrompido por desafios encontrados no sistema de saúde. Por dois anos, ele ficou sem a medicação necessária, após o médico que o acompanhava falecer. Outros profissionais se recusaram a assinar as prescrições para o tratamento, alegando que não conheciam a doença e que o processo era trabalhoso. Essa interrupção resultou em uma piora no quadro de saúde do garoto, que necessitou de cirurgias. Quando tinha 11 anos, Davi faleceu durante um desses procedimentos, com Keyla presente no centro cirúrgico.
“Foi por Davi que tudo consegui até aqui. Eu saí daquela sala de cirurgia e prometi a ele que isso não ia se repetir com outras crianças e que outras mães não passariam pela dor que a mãe dele passou”, relembra Keyla.
O olhar raro da enfermagem
A figura do enfermeiro navegador emerge como uma agente de transformação. O que começou como uma resposta às iniquidades no acesso ao tratamento de câncer se consolida como um farol de esperança para as doenças raras, garantindo que o conhecimento e os avanços médicos cheguem a quem mais precisa. Ao coordenar o cuidado, educar e empoderar pacientes e suas famílias, esses profissionais atuam diretamente na raiz das desigualdades que prolongam o sofrimento.
O "Olhar Raro" se apresenta como uma oportunidade de capacitação para enfermeiros que buscam especialização no cenário das enfermidades raras e que desejam se aprofundar no conceito de navegação. O evento tem apoio da BioMarin, farmacêutica global em biotecnologia.
Referências
1 CONSELHO FEDERAL DE ENFERMAGEM (COFEN). Resolução COFEN nº 735, de 17 de janeiro de 2024. 2024. Disponível em: Link. Acesso em: 21 ago. 2025.
2 CÂMARA MUNICIPAL DE IMPERATRIZ. Projeto de Lei nº 52598. Institui o Dia de Conscientização sobre Acondroplasia (nanismo) a ser realizado, anualmente, no dia 23 de janeiro. Disponível em: Link. Acesso em: 22 ago. 2025.






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